Um Palacio na Cidade


   Em 1800, a cidade do Rio de Janeiro era pouco mais do que uma pequena vila à beira da baía da Guanabara. Abrigava um grande porto, sede do empório mercantil da colônia portuguesa. O centro da cidade se desenvolvia entre quatro morros1 e se dividia em cinco Freguesias2. Os edifícios mais importantes eram projetados em Portugal e construídos sob a supervisão dos mestres pedreiros portugueses; ou então foram projetados aqui, mas por engenheiros arquitetos europeus, atendendo à demanda do governo colonial ou das ordens religiosas. As casas, em geral com um pavimento - algumas com dois, raras de três ou quatro -, eram construídas com materiais sólidos3. As paredes laterais, quase sempre estruturais, suportam vigas de madeira de desmesurada espessura e colocadas muito juntas, sobre as quais repousam as pranchas do assoalho. As telhas da cobertura, moldadas nas coxas dos escravos, aumentam ainda mais o peso dos telhados, pela espessa camada de massa que as une. A planta4 é invariável.
   Com a chegada de D. João VI e da corte portuguesa - fugida de Napoleão – o Rio de Janeiro tornou-se capital do Reino Unido de Portugal e do Brasil. As coisas teriam de mudar5. A cidade, como vista pelos assustados cortesãos, foi descrita por um desolado Alvares de Araujo (1817): "que desordem, que irregularidade de casas as desta cidade! Ha algumas que parecem palhoças de uma aldeia. Que falta de arruamento, simetria, gosto, comodidade em todas as edificadas ou que se edificam ainda, e nas melhores ruas!"
   Já no século XVIII, em direção ao sul, a cidade desenvolvia-se às margens do Caminho da Lagoa6, dando início à outra rota de penetração, o Caminho do Catete, que "se foi desenhando na trilha dos passos dos índios que iam buscar água potável no Rio Carioca". A ocupação, de maneira diferente daquela do centro da cidade, onde predominavam casas de um pavimento ou casas assobradadas, foi-se fazendo em chácaras e olarias que se beneficiavam da abundância das águas do Carioca.


 

 

1[Castelo, São Bento, Conceição, St. Antônio]


2[Candelária, São José, Sacramento, Santa Rita e Sant’Ana]


3Granito, das pedreiras próximas do centro da cidade, e uma massa composta de cal de marisco, areia do mar e terra gorda, misturada a resíduos de cola de peixe.


4 "À frente, olhando para a rua, um salão; vem, depois, um corredor, e as alcovas sem ar e luz. Sente-se que o pensamento dos construtores foi o de aproveitar, na terra que, no entanto, é vasta e custa pouco, todos os centímetros disponíveis do terreno (…). As casas que ainda se vêem hoje, no centro da cidade, comprovam esta asserção. Os quintais são exíguos, como exíguos, ainda, os páteos".


5 "A cidade dos tempos do Sr D. João VI ainda guarda(va) a fisionomia aflita e asselvajada que tinha na época dos Vice-Reis e Governadores. (…). Ainda era o mesmo chão húmido e feio, prenhe de lagoas verdes e podres, com logradouros públicos cobertos de tiriricas e de sapé, crianças nuas, pretos resmungões e animais à solta; praças despidas de arborização e de beleza, betesgas e alfurjas imundas, estreitas, e um casario reles, velho e desmoronante."


6 "que partia da Ajuda, passando pela lagoa do Boqueirão, depois pela Praia das Areias de Espanha e chegando no Boqueirão da Glória"



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